“Maniac” de Benjamín Labatut

“Maniac” (2023) funciona como uma continuação implícita de “When We Cease to Understand the World” (2019), trabalhando os mesmos meandros da racionalidade científica. Depois de Haber, Grothendieck e dos físicos Erwin Schrödinger e Werner Heisenberg, com um foco no quântico e nuclear, agora temos Paul Ehrenfest e Lee Sedol, com Von Neumann a ocupar a zona central do palco, para discutir não apenas a racionalidade do génio científico, mas também como esse génio nos trouxe até à Inteligência Artificial. A leitura é igualmente compulsiva, são apresentados muitos factos pouco conhecidos, nomeadamente sobre as vidas de cada um, a história é muito bem cosida entre ficção e não-ficção, mas ainda assim pareceu-me menos conseguido que o primeiro livro.

Julgo que me faltou a surpresa do embate sentido no primeiro livro, agora já conhecia a fórmula, mas também porque conhecia já imenso sobre a vida de Von Neumann, assim como sobre as partidas de Go de Lee Sedol contra o AlphaGo. Apesar de estarmos num momento de viragem quanto à IA, não me parece que o possamos aproximar do que foi vivido com a detonação da primeira bomba nuclear. O avanço científico é tremendo, e Von Neumann foi central, tanto para o nuclear, como para a IA, mas isso não o torna um super-humano como o Labatut aqui o apresenta. São convocadas várias figuras que o qualificam negativamente enquanto ser-humano, mas no campo do génio, existe um extremar das capacidades de Von Neumann, tornando-o praticamente não-humano.

É estranho dizer isto, porque ainda recentemente me queixava do excesso de caracterização humana (defeitos e falhas) com que era apresentado Pessoa por Zenith, e agora queixo-me do contrário. Mas julgo que é isso que faz as boas caracterizações, quando elas são credíveis a ponto de nos deixarmos convencer da sua possibilidade real. Se alguém marcou o mundo, deverá ter algo especial, mas também não pode ser elevado a super-homem, correndo o risco de não estarmos a falar de faculdades e feitos humanos, mas apenas de fantasias.

No final do livro, sente-se a grande crítica de Labatut ao excesso de racionalidade com que a ciência define a realidade contemporânea, mas particularmente com que vai construindo o mundo do futuro. Ainda não tivemos um momento de detonação na IA, mas ele chegará…

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